sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Cão sem Plumas

Sentado na beira da estrada
Sem eira nem... um maço de cigarros
Me agarro na lembrança
Que não devo favor pra ninguém
Desempregado, despejado
Nenhum lugar pra dormir
Só sobrou minha coleção de discos
Meu amp e minha guitarra
-Nenhum lugar pra chamar de casa
Eu vou, eu vou, eu vou... me dar mal...
Eu vou, eu vou, eu vou... me dar mal... de novo
Se sou feliz, então não sei
O que sobrou pra mim foi o que criei
Meu som, minha dor, o que escrevi e o que pensei
Imaginei severas batalhas 
De peito nu, sem cota, nem malha
Já, de semblante sério, encarei a noite
Vencedor, perdedor, eu já vi o sol nascer
De um ângulo diferente do teu
-Eu sou um cão sem plumas
Eu vou, eu vou, eu vou... me dar mal...
Eu vou, eu vou, eu vou... me dar mal... de novo
Nenhuma esperança
A realidade bruta
Acorda chutando minha cara
Quando caio na minha vida real
Na merda que estou
Fudido
Tento dormir de novo, não consigo

O Domingo


A manhã de domingo começou de ressaca. Um ou outro foguete estourava, alguém se negando a perder qualquer hora do final de semana festivo. Agora seria no campo do véio joão a apresentação do Adão.
Ica acordou assustado, provavelmente sua mãe já tinha levado as vacas para o campo como era de costume. Ela não sabia que esse domingo era diferente. Olhou pela janela e lá estavam as vacas. Passou direto pela sua mãe e foi levar as mimosas  para outro lugar. De longe dava pra ver o Zé banha com uma cuia na mão gritando e apontando as vacas. Ica balançava a cabeça concordando. Com seu trote desengonçado seguia procurando o gudi ou o Sérgio com o olhar. Foi tocando as mimosas para fora do campo.
Manivela ia com uma enxada arrancando as touceiras que teimavam em nascer no gramado. Na saída par a rua Ica olhou para o gramado certificando-se que não tinha ficado nenhum monte de merda de vaca pra trás.
Zé banha e o manivela foram conferir a copa. Afinal eram filhos de Deus e devedores de impostos. Manivela olhou o campo com um orgulho contido. Seu pai ficaria muito contente com um jogo daqueles.
Depois do almoço desci na rua para ir com a gurizada ver o jogo. Já tinham ido para o campo. Fominhas, não me esperaram. "Tudo bem..." pensei. Atravessei o mato das batatas. Tinha me criado ali na volta. Pulei a sanga. Até banho já tinha tomado naquelas águas. Subi o barranco e cheguei no campo. Tentei me lembrar porquê chamavam de "mato das batatas", sendo que só tinha visto pés de pitangas e um pé de amora, por sinal das mais ruins e amargas que já tinha comido. Nós, quando morávamos na Abílio Rocha só dizíamos "matinho". Matinho e era isso.
Olhei em campo os veteranos estavam prontos pra começar o jogo. Adão estava lá no meio do campo. Pé direito em cima da bola e apoiado no joelho. Escutando as instruções do juiz. "Devo ter perdido o discurso."
Chego onde estão a gurizada e pergunto porquê não me esperaram. "Olha a hora..." Alguém diz.
Começa o jogo com o pontapé do Adão. Aqui no bairro não teve tantas cerimônias. Adão parecia feliz, mais disposto. Procurei pela Lui e não enxerguei.
Nem bem a bola rolou e o juiz já apitou falta a favor do time do Adão, que por instinto se posicionou na área. O time adversário era os Amigos do Adão. O nome era esse. Joca cobrou a falta que saiu longa. O Adão foi dar um pique para alcançar a bola e levou a mão na coxa e saiu mancando.
-Já. Falou o pino, com os olhos vermelhos de vinho.
O Adão permaneceu em campo mais uns vinte minutos. Afinal, são sessenta anos e essa lesão na coxa o acompanhava a muitos anos. Saiu ovacionado. A turma se olhou desconfiada. Já tínhamos uns anos também. Entendiamos um pouco mais de futebol.
- Nunca vi o Adão terminar um jogo. Acho que para falar a verdade, nunca vi um jogo até o fim.
O Eliseu deu risada e concordou. O juliano começou a contar histórias, mas eu estava muito desconfiado para acreditar. Olhei todas as pessoas reunidas, o ambiente em torno do campo e cheguei a conclusão que tudo aquilo era mentira.
O Adão era uma mentira como jogador e nós nunca fomos torcedores do Botafogo ou do Grêmio Alvorada. Estava desconstruindo a imagem de herói do Adão. Eram verdades que apenas eu via. Para as outras, aquele moreno atarracado e gordo era um craque.
Eu balançava a cabeça e me perguntava por quê não fiquei em casa olhando televisão...
Enquanto caminhávamos de volta para a rua, surgia histórias do Joca que uma vez estava jogando com um "22" na cintura. Correndo atrás da bola deixou cair o revólver, voltou, juntou o revolvinho e chegou em tempo de cruzar a bola na linha de fundo.
Todas as histórias soavam mentirosas, mas serviam para dar risadas. Escalações surgiam como por encanto, jogadores eram enumerados, postos para jogar e pareciam verdadeiras seleções. Fanha, Beiço. Coxa, um dos mais balaqueiros. Zé banha no gol, herdou a posição do Renato, filho do eterno candidato a vereador João dos Matos. Esse foi o fundador do Grêmio Alvorada. Outro sonhador.
Tinha a turma do beco. Varela, Conan com seu cabelo que nem se mexia. Buldogue que tinha cataratas nos dois olhos e o Maninho que jogava na frente com o Adão. Papai pela direita.
O pé-sujo, uma lenda viva dos bares de Cruz Alta. Também era atleta. Tocava violão e era um dos que puxava as sertanejas. Lembro dele do tempo que o Valdemar tinha um bar na esquina da Abílio Rocha com a Francisco Alves. Quem nunca foi no bar do Ebari? Só se nasceu de 2000 para cá. Quinho, Pedro e a lista nunca termina. Só minha paciência. Vou para casa arrumar minhas coisas. Tem a viagem de volta e a vida real começando a semana.
Uma mentira. Cada jogador daquele lugar era um mentiroso. Talvez tenha esquecido de muitos. Eram os anônimos que davam brilho para as tarde de domingo, naquele campo a beira de um mato. Algo que nunca mais será.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Bodoque


O grão tinha um segredo. Um segredo que se escondia por trás de toda empafia que apresentava. Para chegar nesse segredo precisamos entrar num contexto.
Era verão. No verão as caçadas são mais seguidas. Diferentemente da caçada de préas, "perias", para nós, se caçava passarinhos no matinho, no marisco, nos fios de luz. Onde tivesse umas árvores reunidas, o instinto humano começava a trabalhar. Isso acontece desde os tempos das cavernas.
A piazada da vila se reunia na rua. sempre agitados. Futebol no campinho, brincar de "se escondê", guerras de limão, laranja e as vezes bodoque.
Sim. Quem já fez um bodoque , quem possuiu um bodoque sabe que ele não é só um brinquedo. Nas mãos da pessoa certa é uma arma. Nas guerras com bodoque só era permitido o uso de bolinhas de cinamomo ou o velho "cinamão". As marcas de guerra era um "vergão" na pele que demorava dias para desaparecer. Nunca soube de algum problema sério por conta dessas batalhas.
Um bodoque, por mais feio que fosse, até de borracha "cansada" (as piores e mais comuns ) , forquilha de lidia, forquilha de cinamomo (as piores), impunha um certo respeito. Feitos de borracha de soro, raros e caros, seriam os que iam na frente. Com borrachas de camara trator, seria um lider. Um bodoque feito de borracha de trator e com forquilha de pitangueira seria um mestre. Seria aquele que um tiro deixaria as penas dos passarinhos voando, perdidas no ar...
Dizia uma lenda antiga que as borrachas de pneus de aviões seriam as melhores. Se um dia você visse uma borracha vermelha, deveria saber que ali tinha uma reliquia. Como toda lenda, ninguem podia dizer que era uma verdade absoluta ou uma mentira. Ficava no imaginario. Mas todo mundo conhecia um cara ja que ja teve um...
O grão tinha um de borracha de trator e forquilha de pitangueira. Bem acabado. Uma forquilha de pitangueira que custou horas e horas de buscas. Inquebravel. A borracha tinha custado quase toda a sua coleção de bolitas. Diziam que umas 500 bolitas tinham sido usadas na troca por um par de borrachas de trator. Uma verdadeira fortuna.
Mas, apesar do bodoque de elite, havia algumas coisas que ninguem notava. Na volta das caçadas, grão não trazia nenhum passarinho. Mas, sempre contava vantagem dos tiros que tinha dado.
A verdade começou a aparecer no dia que o tatu, que nem sabia empunhar um bodoque direito, derrubou um "sebinho" no matinho, perto da sanga. Foi o tiro de bodoque mais ridiculo que alguem deu, mas derrubou o passarinho.
As lembranças começaram a povoar as conversas. Todos sabiam de um belo tiro dado. Um tiro do xaxim que derrubou uma juriti de muitos metros de distancia, da entrada do matinho ate os fios de luz da rua. de uma pedrada numa cobra que o eliseu acertou no mato do marisco.
Varias historias, mas do grão, com seu bodoque, nada. Apontavam um alvo, estático, uma lata uma tabua e o grão detonava. Era o primeiro a acertar. Mas nenhum alvo movel entrava na conversa dele. E, se dizia o melhor.
A verdade era que o grão tinha dó dos passarinhos. Ele atirava pra errar.
Por isso ele treinava para ser certeiro. Quando adquiriu o melhor bodoque era para estar na testa das caçadas e dai, ir espantando os passarinhos. No dia da troca, sozinho, ele lamentou a quantidade bolitas utilizadas na troca. A causa era justa, pensou.
Depois disso, ninguem mais convidava o grão para caçar. N os dias de caçada, ele inexistia.
A lenda do bodoque perfeito se desfez na qualidade sentimental do grão.
Um caçador de passarinhos que sentia pena do abate não podia ser convidado para caçar. Reza a lenda que ele chorava quieto no quarto dele. O bodoque se perdeu pelas coisas dele. Deve ter apodrecido a borracha e quebrado a forquilha com o tempo. Muitas coisas foram oferecido pelo bodoque, mas não aceitou nenhuma proposta.
Ele só queria proteger os passarinhos e era tão bom no tiro de bodoque que sabia errar todos.

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p.s: uma das coisas boas de escrever um texto, é que você pode dar vida a uma personagem e molda-lo como sua imaginação manda. misturar a verdade com a ficção é otimo.
imagem copiada na net. só pra frisar.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Viagem



O dinheiro pode nos levar a conhecer os mais belos lugares do mundo, mas as viagens mais loucas e interessantes são feitas dentro da nossa imaginação

O Sabado 2º Parte

Comprei uma bira, pipocas e me postei deitado no sofá em frente a televisão, com o rádio ligado na 1.140 Cruz Alta AM. As três e meia a RBS cortou o programa da grade e começou a mostrar a Taba India lotada. Tinha muita gente. Autoridades no meio do campo entre os jogadores. O cinegrafista ia mostrando todos, bem devagar, até o seu "Boa Tarde" estava lá. Levantou a mão acenando, movimento caracteristico seu. No radio, o Adauri entrevistava o dono da festa no vestiário. Podia notar a voz embargada de quem muito tinha contribuido pelo futebol da cidade. Apenas uma pergunta ficou sem resposta: "Por quê? Porque nunca aceitou jogar por um time profissional?"
Isso é verdade. Adão tinha recebido varias propostas de integrar uma equipe profissional. O São Luís de Íjui ofereceu ate uma casa para ele envergar a camisa vermelha que era um dos orgulhos da cidade. A S.E.R Santo Ângelo, Atletico Carazinhense, O antigo Aymoré e o próprio Guarani, de Cruz Alta tinha tentado a contratação através de uma intensa movimentação popular. Rifas, raspadinhas e doações não tinham conseguido demover o craque de suas convicções.
Os mais chegados, como joca, que tambem tinha jogado com ele por muito tempo disse que em um churrasco tinham perguntado o porquê não tinha aceitado nenhuma oferta.
"E, trair o Grêmio Esportivo Alvorada? O Botafogo da Vila Hilda? Não. Até um jogador como eu, que jogo por amor ao futebol devo ser compreendido. O futebol deve alimentar minha alma e não minha conta bancaria. Sou feliz assim. O dinheiro traria uma satisfação material, mas não me faria feliz jogando." Grande.
Com certeza era um dos atletas mais respeitados e adorados da zona sul.
O jogo ia começar. Lá estavam Valduíno, Chico cebola, Hermes, Batista, Catê marcando presença. A Querida Mais Linda da Cidade ia dar o pontapé inicial, o cinegrafista malandro só mostrava as pernas e a bunda. Que bunda. Era um bom cinegrafista.
Estava dificil tirar o pessoal de dentro do campo.
Tudo controlado, ia começar ao jogo. A Mais Querida da Cidade fez sua parte e foi saindo de campo ovacionada. "Gostosa, Gostosa" gritavam na geral, o pessoal das cadeiras e os gândulas. Acho até que ouvi o Adão gritando.
Bola rolando e ela foi lançada para o Adão, que já estava enfiado entre os zagueiros. Lançamento longo, A "la Gerson", preciso. Adão mata no peito, deixa ela cair no chão, mansa, e, ja olhando a posição dos adversarios. Olhar de águia, atento na proxima jogada, um corte para a esquerda, um zagueiro ja ficou pra trás, dois passos e a bola dominada, a canhota ja preparada para o chute, quando Adão leva a mão na coxa direita... O estádio ficou em silêncio de morte e, eu dormi.
Apaguei. A mãe estava costurando perto da janela, viu que eu tinha dormido, deixou. Perdi de ver o jogo inteiro.
Quando acordei na tv ja estava passando uma daquelas novelas instrutivas, no rádio estava sendo apresentadas as noticias da região. Meu vinho estava intocado e a mãe estava na Dona Helena tomando mate. Olhei pela porta e só escutava o barulho para os lados do salão do Antero, onde seria o jantar. No churrasco eu ia. Perdi o jogo, mas nem pensar em perder a bóia.
Acho que dormi por conta do cansaço. Quando sai do banho a mãe chegou e só dei uma olhada pra ela que sorriu.
Botei minha melhor e única muda de roupa. Com a domingueira no corpo e saltei porta afora. Na porta de entrada encontrei o Juquinha com uma camisa listrada, tipo de marinheiro, o Tatu, o Eliseu, o "nêgo" Julio que tinha vindo de Torres só pra festa, e ainda se gabava de ter jogado no Guarani nos anos 1980. O Pyno ja estava com o olhar parado, o Bylei e o Diego ja estavam "prontos". O Íssio estava fumando um crivo de cantão.
O momento era festivo e alegremente conversavamos sobre as jogadas do craque da vila. Lembravamos da saudosa equipe que alegrava nossas tarde de domingo, quando o destino não era a lagoa da exposição.
Tinha muita gente e querer descrever todos que ali estavam seria pedir muito. O esquecimento poderia ofender alguem, mas quem estava lá lembra das lágrimas do Adão no discurso. Da mostra de troféus de melhor em campo, centenas, senão milhares.
A festa se foi noite adentro, a Banda do Eba animando a festa. A Brigada apareceu e todo mundo pensou que ela ia chegar "arrepiando". Que nada. Foi arrumada uma mesa e comeram com satisfação. Fazia umas duas horas que o dono da festa e A Querida Mais Linda da Cidade tinham sumido da festa. Especulações a parte, a festança atravessou a madrugada.
Que venha o domingo

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O Sabado 1º parte

Os convites que tinham chegado na semana anterior iam sendo entregues a cada um que embarcava no onibus. O clima de festa aumentava na quantia que os lugares iam sendo ocupados. Surgindo do nada, instrumentos de pagode e começava as famigeradas interpretações covers de sucessos indefectiveis: Trem das Onze, Madalena, Sozinho e outras podreiras.
O destino: Cruz Alta. Motivo: Comemoração do aniversario do Adão. Centroavante icone do time de varzea do "véio" joão no final dos anos 1980 e inicio dos anos 1990.
A viagem durou 6 horas, regada a muito "pé sujo" e cachaça pura mesmo, vinho de mão em mão e... pagode. Nos intervalos, rolava umas sertanejas. Uma das piores jornadas minhas. O motorista usava um tapa ouvidos amarelo. Eu ia com meu walkman. Parecia que não ia terminar nunca essa viagem. Mas, o motivo era louvavel.
Adão foi uma estrela no futebol de varzea da zona sul de Cruz Alta. Até o ex-governador do Estado tinha ido olhar um jogo dele. Foi em um clássico ocntra o Ipiranga da Charqueada. Assim, no singular mesmo. Ficou muito impressionado, como escreveu o jornal Diario Serrano, folhetim municipal que relata as noticias diarias de Cruz Alta e região.
A 1 hora da tarde, o onibus passou em frente ao La Kaza e houve uma verdadeira revolução dentro do ônibus... Ou pandemonio? Eram os casados e solteiros numa gritaria para estacionar o ônibus. As mulheres presentes olhavam para o outro lado. Qualquer coisa poderia ser. Gritos de "Para o onibus, motora...", "Tamô em casa, Tamô em casa..." Os tampões nos ouvidos do motorista salvaram os ultimos quilometros da viagem.
Chegamos em frente ao antigo bailão do Antero e desembarcamos na maior festa. Havia bandeiras nas janelas, da dupla, do Guarani e uma faixa alusiva ao aniversariante.
As rua, normalmente esburacadas, estavam limpas e os cordões estavam pintados de cal e um caminhão do Kiko, se não me engano, tocava musicas num volume ensurdecedor. Era uma festa só.
O jogo seria as 4 horas da tarde, na taba Índia, onde viria muitos convidados. Com o pessoal da vila seria no domingo. Eu não iria na Taba, pois tinha dormido no ponto e ficado sem ingresso. Ia assistir pela televisão. A RBS transmitiria o jogo.
Quando cheguei em casa fiquei surpreso porque ate lá estavam comemorando. O Eliseu contando das vezes que tinha entrado em campo, jogando ao lado do Adão. Realmente seria uma festa que Cruz Alta nunca mais iria esquecer.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Quem sois vós que vem me visitar?

Sentia no rosto o vento frio da manhã de sabado, naquele inicio de abril. Algumas gotas de chuva caiam esparsamente. Olhando para cima podia ver um mar de nuvens negras. Seria o rodeio dos ventos?
As nuvens deixavam o ambiente pesado e opressivo. Até gostei daquele frio. Tinha algo de saudoso e triste nele, e a dor era uma amiga nessa manhã.
A memória libertou-se das amarras da consciencia e engoliu distancias. Esfrego as mãos geladas. Sinto frio. Lembro dos sorrisos, de quantas vezes tinhamos discutidos, um querendo impor ai outro seu ponto de vista. Quantos desejos de boa-sorte e conselhos tinhamos falado.
Lembrei de uma vida nova começando. Um onibus. Uma cidade estranha, perdida em algum ponto desconhecido do mapa. O sentimento de vitória tambem se fez presente no dia em que te avisei que "agora estou em paz". Agora não posso sorrir
Lentamente me sento no chão, busco nos bolsos um cigarro. Não tenho mais. Quantas vezes me pediu para parar? Quantas vezes falei que parava quando quisesse?
Outros rostos surgem nas lembranças. Alguns, há anos eu não via. Haviam ficado para trás mesmo. Todos tem alguma coisa para dizer. Todos me trazem uma peça do imenso quebra-cabeças chamado destino. Passo a passo vou montando meu passado. Não sei se chegarei no meu presente. Acho que não quero. São tantos momentos. Tantas pessoas para me visistar...
Não consigo me lembrar se alguma vez chorei por ti.... Creio que não. Sim. Imagino que sim. Nunca me decepcionou, isso posso garantir. Nunca te dei um presente. A minha memoria não me engana. Eu já te decepcionei.
O tempo, mais do que nunca, parecia não ter passado. Era tão real e palpavel. Sentia nos ossos um frio estranho. Não daqueles provocados pelas baixas temperaturas. Um frio na alma. Sentia fome. Fome de viver. Sentia-me impotente. Não sabia o que fazer. Nem o que falar. Dizem que as cores das flores definem um sentimento. Qual é a cor do meu pesar?
Branco? Vermelho? Amarelo? Incolor talvez...
Não. Nada me serve hoje. Não quero paz. Não quero mais dor. Já tenho minha cota. Me contento com o que possuo.
Impotente?
Submisso? Não. Nunca. Jamais.
Mas, em silêncio sim. Dessa forma quero ficar.
Meus olhos tristes acompanham esse tempo cinzento, que reaviva o passado e remexe a memória. Quantas vitórias...
Bem mais que derrotas.
Garanto